Texto integral da intervenção do secretário regional da Presidência, Vasco Cordeiro, na apresentação, hoje, em Ponta Delgada, do parecer dos Açores sobre o Livro Verde da Política Marítima Europeia:
“O Governo Regional entregou ontem ao Comissário Europeu das Pescas e dos Assuntos do Mar o parecer sobre o Livro Verde da Política Marítima Europeia, num claro sinal da importância política e estratégica que a definição de uma futura Política Marítima Europeia tem para a nossa Região.
Como bem referiu o presidente da Comissão Europeia na sessão de abertura da conferência “A Política Marítima Europeia e as Regiões”, os Açores têm, no que respeita à utilização sustentável dos recursos marinhos e noutras matérias relacionadas com o mar, uma clara posição de liderança.
Foi com essa consciência que o Governo Regional resolveu apresentar, no início desta fase de consulta pública, um contributo formal.
Isto foi possível porque, desde que foi anunciada a intenção da Comissão Europeia apresentar um Livro Verde, há cerca de um ano, começamos a trabalhar neste assunto, nomeadamente no âmbito da Conferência das Regiões Periféricas e Marítimas da Europa, e, após se conhecer as primeiras versões consolidadas do Livro Verde, há cerca de quatro meses, foi constituído um Grupo de Trabalho interdepartamental com o objectivo de elaborar o nosso contributo.
A apresentação do nosso contributo nesta altura permitirá que em todos os desenvolvimentos subsequentes deste tema, nomeadamente ao nível do Parlamento Europeu, Comité Económico e Social e Comité das Regiões, entre outros, possamos participar, não já na perspectiva de apenas ouvir as posições de outros, mas de avançar já com as propostas e posições concretas que podem, assim, também servir de referência para este debate.
Saliente-se, porém, que, para o Governo Regional, a apresentação deste contributo não encerra a nossa participação neste debate.
Continuaremos a participar e a acompanhar este assunto, não só no período de consulta que está a decorrer, mas, também, na fase que se segue de provável elaboração do Livro Branco.
Ainda em termos de procedimento de elaboração deste documento, de salientar a disponibilidade dos parceiros sociais e partidos políticos no processo de recolha de contributos desencadeado pelo Governo Regional.
Uma referência e um agradecimento muito especial à Universidade dos Açores, que, na pessoa do Prof. Doutor Ricardo Serrão Santos, do Departamento de Oceanografia e Pescas, e do Prof. Doutor Rui Coutinho, do Departamento de Geociências, colaboraram de forma inexcedível com o Governo Regional na preparação deste contributo.
Do ponto de vista material, o documento agora entregue contém as experiências e as soluções que os Açores têm vindo a implementar, ao longo do tempo para fazer face aos desafios do desenvolvimento sustentável.
Nesta matéria, os Açores têm algo para disponibilizar à União Europeia, seja a forma como regulamos a utilização de determinadas artes de Pesca, a criação de áreas marinhas protegidas ou a definição dos planos de ordenamento das nossas orlas costeiras, entre outros aspectos.
Neste contributo, reivindicamos, com exemplos de boas práticas, a liderança que nos foi reconhecida pelo Dr. José Manuel Barroso.
No seguimento disto, também existem aspectos que nos suscitam as mais fortes reservas e críticas.
É o caso da questão relativa à forma como são encarados os transportes marítimos ou a perspectiva que transparece do Livro Verde quanto à questão dos riscos costeiros.
Também manifestamos a nossa discordância quanto ao facto das Pescas virem tão superficialmente tratadas no Livro Verde.
Não se compreende como se pretende definir uma abordagem integrada à questão da gestão sustentável dos recursos marinhos e ignora-se a parte relativa às Pescas.
Em resumo, a apreciação que fazemos sobre o Livro Verde consiste no seguinte:
O Governo Regional dos Açores considera extremamente positiva a iniciativa da Comissão Europeia de lançar o debate sobre a definição de uma futura Política Marítima Europeia (PME).
É muito positiva a aposta que o Livro Verde afirma na obtenção de mais e melhor conhecimento sobre o meio marinho, os seus recursos e a sua gestão sustentável.
Deve ser dado o devido destaque à dimensão atlântica e insular da União, impondo-se, por isso, uma maior análise ao papel especial do Atlântico na futura PME.
Deve ser reforçada a visão do Atlântico como fronteira marítima ocidental da União Europeia.
No âmbito da criação de uma Guarda Costeira Europeia e no funcionamento de organismos como a Agência Europeia de Segurança Marítima, deve ser dado, no que à afectação de recursos respeita, uma atenção especial ao espaço atlântico.
A gestão da exploração dos recursos pesqueiros deve assentar numa abordagem ecossistémica, precaucionária e de proximidade.
A decisão de estabelecer o livre acesso à subárea Açores da ZEE portuguesa, na zona entre as 100 e as 200 milhas, é contraditória com a perspectiva que enforma o Livro Verde da Política Marítima Europeia, pelo que deve ser revogada.
O estudo do impacte da actividade da pesca fora das zonas de jurisdição onde as frotas europeias actuam deve ser aprofundado.
A PME deve ter em conta as especificidades das ilhas no tratamento das questões relacionadas com a orla costeira, nomeadamente, nos aspectos relativos à importância da gestão integrada das mesmas.
A PME não ignorar, no caso da transferência de custos associados aos riscos, que, para as populações das ilhas, viver nas zonas costeiras é uma inevitabilidade.
A problemática dos riscos, incluindo os de origem sismo–vulcânica, deve ser considerada uma área prioritária de I&D.
Propõe-se a criação de uma rede de Escolas Europeias das Profissões do Mar, com planos de formação comuns, que fomente a valorização e facilite a mobilidade dos profissionais desse ramo de actividade, dentro do espaço comunitário.
Propõe-se a criação de um Observatório Europeu do Emprego e Profissões do Mar.
Deve ser dada especial atenção à iniciativa MoMar, já que esta constitui uma plataforma tecnológica capaz de colocar a Europa na verdadeira vanguarda científica e tecnológica dos observatórios a nível mundial.
A cabotagem insular e o transporte marítimo inter-ilhas devem ser alvo de um programa específico de apoios comunitários, num quadro de equivalência ou inserção nos objectivos globais das redes transeuropeias de transportes.
A União deve apostar no estabelecimento de programas que incentivem o desenvolvimento de projectos de investigação na área das energias renováveis relacionadas com o mar.
A PME deve ter a dimensão das Zonas Económicas Exclusivas como um critério determinante para o acesso a fundos comunitários.
A PME deve ter uma atenção diferenciada para com as regiões que suportam, no âmbito marítimo, custos imputáveis ao interesse europeu”.
GaCS/AP
25 de july, 2006 por Lotaçor